Entrevista - Ivanil Falcão Barbosa

Ivanil Falcão Barbosa mudou-se para o acampamento Cachoeirinha há nove anos e atualmente é coordenadora do local. Assim como sua família, sempre atuou no campo trabalhando no corte da cana, nos laranjais, e na manipulação do gado e tratores. Antes de se estabelecer no acampamento, D. Ivone, como é chamada, tentou fazer parte de assentamentos, mas diz que não recebeu resposta à sua proposta.

D. Ivone luta desde sua chegada ao local pela legalização da terra. Já organizou manifestações e campanhas para promover seus objetivos, no entanto, diz que a maioria se perde no tempo ou não recebe importância suficiente por seus colegas. Acredita veemente que o Governo os quer naquelas terras: “O que falta para o acampamento virar assentamento é o Lula assinar o papel”. Completa seu pensamento dizendo que os pequenos agricultores são de extrema importância para o país, pois colocam a comida na mesa. Por isso, o governo tem liberado a comercialização dos alimentos produzidos pelo acampamento para abastecer instituições da cidade. No entanto, o Estado não presta assistência financeira aos acampados, o que impede a produção em larga escala. Cada família lucra no máximo quatrocentos reais por mês. Para piorar, ao invés de uma cesta básica mensal, as famílias recebem apenas duas cestas básicas ao ano.

O local não conta com luz elétrica, água encanada, energia entre outros fatores essenciais que dificultam a vida dos moradores.  Em relação à saúde, os acampados dependem do transporte público para ir à cidade, uma vez que ainda não foi instalado um posto de saúde na região.

A coordenadora diz que muitas famílias desistiram de morar no assentamento: “Esfria bastante, gente desistiu, pois não acredita que dará certo”. De setenta e oito famílias que residiam na região no início da ocupação, hoje restam apenas trinta e cinco. Apesar de o projeto estar em andamento há treze anos, as famílias que restaram não perderam a esperança, muito menos a união. Quando surge alguma dificuldade relacionada à fome ou qualquer outra coisa, as famílias acampadas prestam apoio umas às outras.

Todas as crianças têm acesso ao transporte escolar e regularmente vão à escola. Como a principal unidade se localiza na cidade, as crianças entram em contato com jovens de diferentes realidades, além de conhecer uma organização urbana. Apesar de isso ser aparentemente benéfico, as crianças acampadas são descriminadas por pertencerem a um núcleo social inferior. Elas são reconhecidas como ‘os pés vermelhos’ por trabalharem na terra.

D. Ivone relata ainda que as crianças auxiliam no trabalho de seus pais desde pequenos. Ela afirma com prestígio que o desejo dessa nova geração é se formar em uma boa faculdade para oferecer melhores condições de vida a essa gente.

Segundo D. Ivani, o que ela realmente deseja – assim como os outros acampados – é fazer com que a área do acampamento seja regulamentada e se torne um assentamento. Nesta situação, o governo disponibilizaria certa verba para os ex-acampados poderem investir no crescimento de suas produções. “A gente luta, somos honestos e queremos ajudar os outros” diz. Acredita que como assentados, eles vão conseguir abastecer as famílias que moram lá e as que estão pela redondeza.

A coordenadora diz que os acampados plantam todos os tipos de legumes, mas querem começar a produzir fubá, farinha de mandioca, ovo e leite, pois as instituições necessitam desses produtos. Barbosa afirma que seus produtos são praticamente cem por cento orgânicos, mas há ocasiões em que os aviões que despejam produtos químicos para fortalecer o crescimento da cana comprometem o seu plantio.

            Embora tenhamos observado muita pobreza e poucos recursos, foi possível conhecer pessoas que permanecem otimistas no presente e guardam perspectivas e sonhos para o futuro.

É importante ressaltar que a religiosidade está muito presente no dia-a-dia dos acampados. Sendo ela o único refúgio daquela gente, Ivanil termina a entrevista demonstrando sua fé: ‘só Ele que nos ajuda’.

Análise

    A partir da entrevista de Ivanil, é possível tirar diversas conclusões e constatações. Primeiro de tudo, é perceptível que ela, assim como qualquer um dos moradores do assentamento, tem o sonho de que o local se torne regularizado e ganhe status de acampamento. Infelizmente, apesar dos consecutivos (e ilusórios) discursos políticos de que o lugar está quase sendo regularizado, a situação é bem diferente, uma vez que essa circunstância se arrasta há mais de 13 anos. Porém, as trinta e cinco famílias que restaram das antigas setenta e oito ainda não desistiram, e continuam se mantendo apenas com o dinheiro de suas respectivas hortas.

     É importante destacar que o fato de o acampamento ser ilegal traz aos seus moradores diversos malefícios, como a falta de luz elétrica, água encanada, além da impossibilidade de qualquer ajuda financeira. Algumas famílias têm sérias dificuldades financeiras devido aos problemas já citados, mas os moradores do local são muito unidos e se ajudam para garantir que nenhum passe fome, fato que evidencia que falta de dinheiro não é empecilho para caridade e altruísmo para os moradores do lugar. Apesar do fornecimento do transporte público para as crianças irem às escolas, elas são constantemente discriminadas devido à sua condição, o que torna evidente a remanescente a ignorância de grande parte da população brasileira, que despreza os sem terra.

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